silmara parecia estar prestando bastante atenção na fala do subsupervisor de sinergia administrativa, que mostrava o baseline traçado para o último trimestre do ano, mas na verdade sua única preocupação era manter as pontas dos belos, loiros e cacheados cabelos a uns dois centímetros do tomara-que-caia preto. era uma moça consciente de suas limitações intelectuais e resistente ao trabalho dedicado; sabia exatamente porque ainda estava empregada e não tinha maiores problemas com isso. vestia-se pela manhã sabendo que precisava agradar diariamente, e havia caprichado naquele dia - aquela combinação de cachos angelicais, pele bronzeada e seios apertados seria inspiração para comportamentos pouco condizentes com a política da empresa nos banheiros daquele andar.
reginaldo, por sua vez, ocupava-se de outra forma: enquanto o superior despejava seu falatório, o rapaz cutucava com a ponta de uma lapiseira uma verruga mal cauterizada em seu polegar esquerdo. sabia que um procedimento rápido e quase indolor poderia resolver o problema, e estava ciente dos riscos de infecção, mas preferiu manter o tumor em seu dedo, já que a brincadeira tornara-se uma das atividades mais prazerosas da sua rotina. enfiava a lapiseira na lesão e só se satisfazia ao conseguir retirar pequenos nacos de pele morta, que ia empilhando ao lado de seu bloco de anotações. nunca escrevia nada ali.
esse comportamento enojava aline, funcionária que se indignava com a falta de profissionalismo e a apatia dos colegas. acreditava que todos sempre deveriam dar 110% para a empresa, que pagava os salários em dia e fornecia oportunidades únicas para crescimento pessoal, desenvolvimento de habilidades, aumento da empregabilidade. são tempos difíceis, as companhias estão demitindo, é necessário sempre se mostrar útil para os empregadores. anotava tudo o que era dito, fazia perguntas, propunha soluções para os gargalos apresentados.
as interrupções chateavam adolfo, o chefe. sentado na ponta da mesa, com a cabeça apoiada pela mão esquerda, imaginava a nudez de silmara quando a voz estridente de aline arruinou suas fantasias pela terceira vez em dez minutos. nesse momento, fez a anotação mental: pediria ao departamento pessoal que desse o aviso prévio para a feiosa inconveniente - usaria os tempos difíceis como desculpa - e requisitaria a contratação de uma ruiva recém-formada. aquela equipe claramente precisava de uma menina ruiva.
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Um comentário:
hahahha, tá mandando muito bem.
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