como nos últimos não sei quantos dias, saio do ônibus um pouco depois das cinco da tarde e me dirijo à esquina que me foi designada como o início do meu percurso. nos bolsos das calças, trago o material de trabalho: cerca de quinhentos retângulos de papel rosa, nos quais o corpo e algumas informações sobre pâmela estão porcamente impressos.
pâmela, na verdade, é ariadne, uma menina simpática e de humor inocente, que chegou na cidade pensando em morar com uma tia e estudar radiologia, e acabou entrando, dois meses depois, no estabelecimento de meu tio afrânio, atrás de qualquer ocupação que a afastasse dos estupradores do abrigo em que passava as noites. hoje, inspira centenas de ereções com suas nádegas bem fornidas, mas só permite que uma delas se esgote entre seus rins a cada dia. questão de tempo, esse limite.
tenho que seguir por quatro quarteirões, depois virar a esquerda, caminhar mais quatro e repetir o processo até terminar um quadrado imaginário, isso enquanto distribuo a propaganda para os transeuntes. poderia entregar essas porcarias para qualquer um, mas me sinto comprometido por se tratar de família e por estarem me pagando - uma mixaria, mas não deixa de ser grana. pra estrangeiro não rola: sempre dão uma risadinha, guardam no bolso, mas quem é que vai gastar tempo de viagem num puteiro pé-de-rato qualquer? é sempre bom evitar os velhos e os moleques, também. o público ideal são os adultos voltando do trabalho, com semblante abatido, principalmente os feios e gordos. não fossem esses caras, qualquer papelaria seria mais rentável que as zonas.
depois de duas voltas, é melhor deixar os folhetos restantes nos orelhões e pontos de ônibus, o pessoal sabe o que achar nesses lugares. o único problema dessa estratégia são essas mulheres que nem a d. cândida, uma senhora que trabalha numa banca de jornal ali perto e, sempre que pode, passa pelos telefones públicos arrancando os anúncios das moças e jogando tudo fora. pode parecer bizarro, mas você se impressionaria com o tanto de velhas moralistas que ficam atrapalhando o trabalho da gente.
eu e os outros caras temos o costume de horrorizar com essas tias, mas a d. cândida geralmente é alvo de algum respeito. é conhecida a história da filha dela, uma mocinha que trabalhava na noite há alguns anos atrás e teve a cara completamente retalhada por um animal, que não aceitou a recusa de um beijo na boca. taí um problema em atuar nesse ramo: sabemos que há muita gente podre por aí, e que essas meninas estão sujeitas ao pior que se pode imaginar.
é foda, mas eu não posso fazer nada, dependo da grana do tio afrânio. ele também já tentou de tudo nessa vida, só agora conseguiu se estabilizar um pouquinho. a ariadne, tadinha, é um doce de pessoa, mas não tem nada melhor com o que contribuir para a sociedade do que aquela bunda linda. o pessoal da gráfica mesmo, com aquele equipamento de merda, só tem mercado dentre os puteiros e os pais de santo - e quase não tem pai de santo por ali.
uma pena, talvez seria bom pra proteger as meninas.
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Um comentário:
forte o_o
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